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Joanita Warry Ssenfuka (35) é do Uganda e é engenheira de telecomunicações e ativista.

Pedi muitas vezes a Deus que me perdoasse – por o que quer fosse.

Aos sete anos senti-me atraída pela minha melhor amiga. Vivíamos juntas; crescemos juntas. Aos catorze anos apercebi-me de que esse sentimento não era normal; obtive a definição de que mulheres que se sentiam atraídas por mulheres e compreendi que eu era algo  a que se chama “lésbica” – o que eu não queria ser! Tentei tantas coisas para mudar isto: rezei, jejuei. Pedi muitas vezes a Deus que me perdoasse pelo que quer que fosse – não o sabia muito bem. Li alguns livros acerca de pessoas que vão para o inferno por se sentirem atraídas por pessoas do mesmo sexo. Essa foi a minha educação católica e, portanto, passei por todas as etapas como menina católica. Estava muito amargurada comigo mesma por causa dos meus sentimentos. Fiquei noiva de um rapaz, porque pensei que devia tentar compreender como me sentia. Mas no caminho entendi que isto terminaria odiando-me a mim própria ou odiando outra pessoa. Deste modo decidi ficar com os meus verdadeiros sentimentos e, talvez, não estar com alguém, porque era um pecado. Tentei ir a diferentes igrejas, tentei tirar o “diabo”, mas não funcionou.

Todos somos pecadores de alguma maneira.

Quando me apercebi que os meus sentimentos nunca mudariam, comecei a me compreender pela primeira vez. Disse para mim mesma que Deus sempre soube que eu era lésbica; que a partir desse momento comecei a crescer no ventre da minha mãe. E ele não terminou a gravidez de qualquer maneira. Então, cheguei à conclusão de que a minha vida tem um propósito.

Deus disse: ama o pecador, odeia o pecado. Apercebi-me que muitos estão a usar a Bíblia para demonizar pessoas como eu. Ao mesmo tempo apercebi-me que um pecado é um pecado. E todos somos pecadores de alguma maneira, se mentes, ou se roubas, só és um pecador como todos os demais. Qualquer um que me julgue é um pecador como eu. Se é a minha mãe, o meu irmão, a minha irmã, quem quer que seja, não me importa. Não deixarei que ninguém me julgue por ser quem sou. Não fui eu quem decidiu ser lésbica. Quando comecei a aperceber-me dos meus sentimentos, era jovem, era uma menina! Não sabia nada acerca dos pecados. Mas compreendi: isso sou eu. Sempre fui assim e sempre o serei. Comecei a me aceitar e correu bem! Comecei o ativismo dizendo a mim própria: tenho que começar a viver só e devo ajudar outras pessoas que são como eu. Assim comecei a abrir-me sobre mim própria e a defender a minha posição.

Violações Corretivas

O Uganda é um lugar perigoso para viver para as pessoas LGBT. Há muitas lésbicas no Uganda que estão a ser violadas como forma de correção. Mas isto faz-se de maneira encoberta, silenciosa, porque a maior parte do tempo fazem-no os membros da família. Eles pensam: “Ela nunca teve relações sexuais com um homem e é por isso que tem sentimentos sexuais com as suas companheiras”. Não diria que isto é pior ou que tem sorte porque são “simplesmente” violadas e não são assassinadas. Vives com essa dor para o resto da tua vida, especialmente quando não podes falar disso em público para obter justiça.

A tua vida nunca será a mesma

O projeto de lei contra a homossexualidade que primeiro previu a pena de morte e em seguida a prisão perpétua foi anulado, mas pode regressar a qualquer momento. Embora a situação legal tenha mudado, há um aumento de casos: entre 2014 e 2015 há um grande aumento de prisões devido à homossexualidade ocorrida. A polícia continua a utilizar a antiga lei colonial contra o “conhecimento carnal (…) contra a ordem da natureza” para prender-te e expor-te aos meios de comunicação. Quando te metem na prisão, usam outra razão, se algum advogado pergunta: como vagabundos ou perturbação da ordem pública: essas são as coisas que estão escritas formalmente na tua declaração. Quando te expoem aos meios de comunicação, dizem: “Essas pessoas estão divulgando a homossexualidade, estão a recrutar os nossos filhos!”. Depois de o teu rosto ter corrido os media e ser marcado como homossexual, a tua vida nunca será a mesma, mesmo se a polícia te  libertar. Lutarás para encontrar um lugar para viver. Muitos são repudiados pelas suas famílias. Se ainda és uma criança ou um adolescente, nunca poderás obter mais educação. Se alguém na tua escola se apercebe que és gay, serás expulso. Se a tua família te repudia, é muito difícil ganhar dinheiro. Nesse momento, a nossa organização Freedom and Roam Uganda tenta criar consciência e capacitar os membros para que se possam manter com vida.

A única coisa positiva é que todo o país começou a falar sobre de homossexualidade e todos sabem agora que os homossexuais realmente existem. Antes, muita gente pensava que qualquer pessoa homossexual não podia ser do Uganda, não existia no Uganda.

Só o diálogo com a igreja tornará possível a mudança.

A igreja deve estar ali para nos proteger, a cada cristão, a cada um, a qualquer ser humano. É seu papel falar contra a injustiça e contra a violação dos direitos humanos. Em vez disso, a igreja formou parte de um comité que decidiu criar o projeto de lei contra a homossexualidade. Então apoiam a violência contra a humanidade. Isso é tão diferente do que se supõe que é. Temos mais pastores que médicos ou enfermeiras no Uganda. Temos mais igrejas que hospitais. Muitos deles pregam o ódio contra os homossexuais. Têm muitos seguidores a escutá-los.

Para mudar a situação geral das pessoas LGBT no Uganda, devemos nos  concentrar em ter diálogos com diferentes pessoas na Igreja. Temos que fazer muita sensibilização e trabalhar juntos com a igreja. Isto é o que tornará possível a mudança. É uma longa viagem, mas passo a passo conseguiremos.